Enquanto o número de diagnósticos de Transtorno do Espectro Autista (TEA) cresce no Brasil, a estrutura do Sistema Único de Saúde (SUS) parece não acompanhar essa realidade. Famílias em todo o país travam uma verdadeira batalha diária para garantir um direito básico: o acesso a atendimento público de qualidade para crianças, jovens e adultos autistas.
Filas, burocracia e a espera que não acaba
Nos corredores de unidades básicas de saúde, Centros de Atenção Psicossocial Infantil (CAPSi) e clínicas especializadas, é comum ouvir relatos de mães que esperam meses — em alguns casos, mais de um ano — para conseguir uma consulta com um neurologista, psicólogo ou terapeuta ocupacional. Para muitos, o diagnóstico já chegou, mas a falta de profissionais e vagas nos serviços públicos torna o início do tratamento um desafio quase intransponível.
A burocracia é outro obstáculo que transforma o acesso em um verdadeiro labirinto. Encaminhamentos que se perdem, documentos que demoram a ser processados e a dificuldade de marcar exames ou agendar retornos são parte da rotina das famílias. O resultado? Crianças que perdem janelas preciosas de intervenção precoce e adultos autistas que seguem invisibilizados pelo sistema.
Políticas públicas que não saem do papel
Apesar de leis como a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Lei nº 12.764/2012) garantirem direitos como diagnóstico precoce, atendimento multiprofissional e inclusão, a realidade vivida pela maioria das famílias brasileiras é outra. Faltam centros de referência, profissionais capacitados, campanhas de conscientização e, principalmente, vontade política para transformar promessas em ações concretas.
Em muitos municípios, o atendimento para autistas é terceirizado ou depende de convênios com instituições que não dão conta da demanda. Isso faz com que o acesso à saúde se torne desigual, privilegiando quem tem recursos para pagar por atendimento privado ou recorrer ao Judiciário em busca de direitos que deveriam ser garantidos administrativamente.
A exaustão das famílias
O peso da negligência do poder público recai sobre os ombros de mães, pais e cuidadores que se veem obrigados a virar especialistas, terapeutas e advogados, muitas vezes à custa da própria saúde mental. Sem apoio do Estado, redes de apoio informal surgem nas redes sociais e comunidades, tentando suprir — ainda que parcialmente — o que deveria ser garantido por políticas públicas eficientes.
Conclusão: um sistema que precisa de urgência, não de promessas
A realidade do autismo no Brasil é marcada por avanços legislativos e retrocessos práticos. Enquanto o discurso oficial fala em inclusão, as famílias enfrentam um sistema ineficiente, sobrecarregado e despreparado. A luta pelo atendimento no SUS não é apenas uma demanda por saúde, mas um clamor por dignidade. É hora de o Brasil enxergar o autismo além das campanhas de abril e encarar, com seriedade, a responsabilidade de cuidar de todos — independentemente da condição ou classe social.