À medida que crianças autistas crescem e deixam para trás os serviços terapêuticos voltados à infância, uma nova fase da jornada começa — e, com ela, surgem dúvidas, desafios e, muitas vezes, o sentimento de desamparo. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição que acompanha o indivíduo por toda a vida, mas a maioria das políticas públicas, programas terapêuticos e intervenções ainda estão fortemente concentrados na infância. E o que acontece quando essas pessoas chegam à idade adulta?
Apesar dos avanços nas últimas décadas em termos de diagnóstico precoce e tratamento infantil, a vida adulta de pessoas autistas ainda é um território pouco explorado e, em muitos casos, negligenciado. A falta de suporte contínuo após os 18 anos é um dos maiores obstáculos enfrentados por jovens autistas e suas famílias. A transição para a vida adulta é marcada por mudanças significativas — fim do ambiente escolar, busca por emprego, construção da independência — e, para quem está no espectro, essas mudanças podem ser especialmente desafiadoras.
O fim das terapias não é o fim das necessidades
Durante a infância, muitos autistas recebem acompanhamento de fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos e educadores especializados. Porém, ao entrar na vida adulta, esse suporte costuma diminuir ou desaparecer, principalmente por conta da limitação dos planos de saúde ou do SUS, além da escassez de serviços específicos para adultos com TEA.
As demandas, no entanto, continuam. Muitos adultos autistas enfrentam dificuldades na comunicação social, na autorregulação emocional e no convívio em ambientes profissionais. Outros, que apresentam grau de suporte mais elevado, necessitam de acompanhamento diário em tarefas básicas. Sem apoio contínuo, a qualidade de vida pode ser seriamente comprometida.
Inclusão no mercado de trabalho ainda é um desafio
Outro ponto crítico é o acesso ao mercado de trabalho. Embora algumas empresas tenham avançado na inclusão de pessoas neurodivergentes, o número de adultos autistas empregados ainda é muito baixo. A falta de adaptações no ambiente corporativo, o preconceito e a ausência de programas de capacitação são fatores que dificultam a inserção e a permanência desses indivíduos no mundo profissional.
Rede de apoio e saúde mental: a importância de não caminhar sozinho
A saúde mental dos adultos com TEA — e de seus familiares — também precisa ser levada em conta. A falta de perspectivas de futuro e a sobrecarga emocional são frequentes. Sem apoio psicológico adequado e políticas de inclusão real, muitos se veem isolados socialmente.
Grupos de apoio, projetos comunitários e iniciativas de inclusão cultural, esportiva e profissional têm mostrado bons resultados em várias regiões do país, mas ainda são iniciativas isoladas. A sociedade precisa ampliar o debate e investir em estratégias de longo prazo para garantir dignidade e qualidade de vida a essa população.
Conclusão: A vida adulta é apenas o começo de outra etapa
O autismo não desaparece com o tempo. Por isso, é fundamental entender que os cuidados e as políticas públicas não podem se encerrar junto com a infância. A transição para a vida adulta deve ser acompanhada, planejada e respeitada, oferecendo suporte real e contínuo para que as pessoas com TEA possam viver com autonomia, dignidade e inclusão.
Falar sobre o autismo na vida adulta é uma forma de romper o silêncio que cerca essa fase e de reconhecer que o cuidado precisa ir além da infância. Afinal, todas as fases da vida importam — inclusive (e especialmente) aquelas que ainda são invisíveis aos olhos da maioria.
Gi Ferro – Viver Autismo
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